Meiga-i cun micro na man e o público de fondo no Agrocuir
Meiga-i no Agrocuir. Foto: zOevixion
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Criaçom de comunidade no Festival Agrocuir

Quando em junho se celebra o Orgulho por muitos lugares do mundo ocidentalizado sempre xordem vozes críticas, ou até Orgulhos que se qualificam de críticos, a dizer que “o Orgulho nom se vende”. Questiona-se assim o modelo que se promove desde o capitalismo, desde as instituiçons, as mesmas que nalgum momento eram explicitamente queerfóbicas e agora defendem e financiam os Orgulhos hegemónicos nos que normalmente se esquece que o Orgulho nasceu com queers racializadas a lhe tirar tijolos à policia em Stonewall e dirigidos maioritariamente a um público masculino gay normativo, todo num ambiente de festividade urbana apolítica.

Contudo, nom caiamos em reivindicar um Orgulho sem qualquer tipo de festa, só com manifestaçom, palestras… (nom seria a primeira vez que ouço isto), entendendo assim que a festa tem carácter apolítico por natureza. O Festival Agrocuir demonstrou-nos que isto é falso, e já vai pola sétima ediçom. Se este festival tem tanto êxito, e todes estavamos a desejar ir após 2 anos sem el, é porque é um festival cumha alta carga reivindicativa, porque reivindica um espaço festivo próprio para a comunidade LGBT+. Este fim de semana ao ano no interior da Galiza é um paraíso para nós, logo de que durante todo o ano sintamos que a maioria das festas que se celebram nom som o nosso sítio. E foi-se criando este paraíso graças a que se cria desde a ideia de comunidade, contrária às ideologias individualistas do capitalismo.

Nas diferentes propostas cénicas que desfrutamos no Agrocuir deste ano estava este conceito. Poderiamos aludir a que a ideia de comunidade está intrinsecamente ligada às artes cénicas, ainda que muitas vezes se esqueça isto, mas neste caso esta ligaçom parece-me maior. A razom disto radica em que nom só esta ideia é intrínseca às artes cénicas, senom que também está na base dos dous eixos vertebradores do festival: a defensa do rural e o ativismo polos direitos LGBT+.

No serám da sexta-feira desfrutamos/ participamos dumha performance de Nelu Vermouth, paralelamente ao ocorrido na última ediçom do festival. Tanto na performance do 2019 como na deste ano, Nelu criou umha dinâmica de grupo co público, e em ambas estavam presentes os cuidados dumha forma ou doutra, esse conceito que foi tam (mal) usado no ativismo LGBT+ que atualmente em certos espaços é um termo tabu; mas os cuidados, de serem bem geridos, som o piar dumha comunidade. Este ano Nelu estava entre o público, nom no palco, o que inevitavelmente produz um maior achegamento. Fijo bailar/ cantar/ participar ao público, que deixava de ser público. Expujo-nos aes outres coa distribuiçom da gente que criou, mas nom era umha exposiçom incómoda, criou-se um ambiente de confiança, de seguridade, de lembrar-nos o que é ser queer. O público reagia de forma natural, nom eram reaçons forçadas polo artista como vemos algumhas vezes. E berramos juntes a Xohana “eu também navegar!”.

Dessa noite compre lembrar também que as pessoas nom binárias estivemos presentes, deixárom-nos existir por um fim de semana. E digo essa noite concretamente porque atuárom O Rabelo e Fado Bicha, artistas diferentes de países diferentes mas com muito em comum: nom bináries a fazer música queer partindo da música da sua terra combinada coa música contemporânea. E para quem nom conheça estis artistas, ambes se figêrom famoses em programas de televisom: no Luar e no Festival da Canção, respetivamente. Com respeito a isto, lembrou O Rabelo no concerto que naquel concurso de regueifas, o nosso verso improvisado, o chamaram após um programa para lhe dizer que nom se metera em política, que nom ia ter trabalho, porque improvisando esse dia falara da manipulaçom na TVG. A verdade é que tem o seu público, cuida do seu público, e se tem essa comunidade que o apoia é porque precisavamos dum referente na música galega contemporânea abertamente nom binárie orgulhose de habitar as margens.

Pola sua banda, Fado Bicha, ainda que nom conseguissem ir a Eurovisom, sim conseguírom um espaço importante no panorama queer português, e até no galego também. Neeumatiko tem um vídeo analisando essa música que levaram ao Festival da Canção. Pero eu da sua atuaçom quero salvar dous momentos nos que figêrom explícito que sabiam onde estavam, que muitas vezes nas artes cénicas vemos como nom é o habitual, vemos o mesmo espetáculo repetido mil vezes em diferentes palcos da mesma forma. O primeiro é umha frase que dixo a Lila, a voz do grupo, ao começo: “infelizmente não falamos galego, mas obviamente não vamos falar espanhol”, e o outro é a “surpresa especial” que tinham para nós: a Lila colheu o seu caderno e leu parte da letra da música que estava a cantar em galego, coa pronúncia do público que a estava a ouvir. Além de fazer referência nalgum momento a que estava numha vila, que ela era dumha aldeia de Ribatejo mais pequena que Monterroso, e que estavam rodeadas de bichas como elas.


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Já no dia a seguir, o sábado de tarde, vimos duas peças nas que também vemos certas semelhanças, seguindo a linha do dito dos dous concertos da sexta. Falo de A Drag Pandeireteira, um espetáculo da Meiga-i, e de Ningún hombre me llevará a la cumbre, de Celeste González. Estas duas artistas também vam procurar no folclore, galego e canário respetivamente, parte da essência dos seus espetáculos, misturando-o coas artes contemporâneas.

Para começar, temos um espetáculo drag, algo que até nom há muito seria impensável misturá-lo coa tradiçom galega (e provavelmente muita gente siga a pensar no drag exclusivamente como o modelo de RuPaul ou baseado no folclore dumha cultura dominante), e até sendo pensado como antagónico à mesma. Meiga-i nom só nos demonstra que a dicotomia entre o drag e o folclore é absurda, senom que ademais nos lembra a história durante o seu espetáculo fazendo pedagogia co público. Ajuda a construir umha memória coletiva ao lembrar as pioneiras desta arte na Galiza, que tem mais dum século de história. Aliás, a categoria na que se inscreve esta drag pandeireteira nom é a paródia, nom podemos metê-la no mesmo saco que certas paródias que temos visto de cómicos (homens) galegos, que chegam a ser insultantes. Meiga-i nom é simplesmente um homem disfarçado de folclórica. Esta meiga contemporânea constrói-se e nasce desde a tradiçom galega, revisitando-a desde a sua olhada queer. E há que valorar o aproveitamento que fai do palco para educar o público, ao qual trata como pailarocas, e ainda com isto, situando-se por cima de nós como umha diva, é umha mais, fala em plural. Esta personagem aparece-se-nos para lembrar-nos de onde vimos, ao igual que Nelu na sua performance, e rirmos das pailanas nas que nos convertemos.

E para seguir, Celeste. Podo falar ainda mais deste espetáculo? Por suposto. Por se nom os lestes, escrevim dous artigos sobre este espetáculo: de quando o vim na Corunha e de quando o vim um ano antes em Vigo. Mas preciso falar brevemente por terceira vez de Ningún hombre me llevará a la cumbre, porque o espetáculo cambiou novamente. Cambiou desta vez polos próprios condicionantes do contexto no que se fazia, e que Celeste soubo aproveitar mui bem. Lembrades que havia audiovisual, jogos de luzes…? Pois aqui foi ao ar livre e de dia, assim que nada disso. Levantou ao público e reinterpretou aquela cena inicial audiovisual. Sete pessoas lá a ler cada umha umha carta de Regina & Celeste, una correspondencia e nom vozes em off gravadas, e Celeste a caminhar logo arrincando as folhas do livro. A potência de viver isto em direto é maior do que o vídeo original. Celeste estava a mui pouca distância de nós. Já logo o resto da peça é no palco. E a gente lá sentada na erva a reagir como nom se lhe ocorreria a ninguém reagir num teatro, porque nom estavamos no lugar sagrado do teatro. Melhor dito, tornamos ao lugar sagrado inicial, aquilo era umha festa dionisíaca. E nom entendades nada negativo nisto, ao contrário. O público respeitou a artista, pero nom desde esse respeito cínico dos grandes teatros, respeitou-na fazendo parte, escuitando-a, cumprindo o que dixo Celeste ao interagir dumha vez com elis: “lo hago por crear comunidad”. E acabou em catarse, por suposto.

'Ningún hombre me llevará a la cumbre' de Celeste González.
‘Ningún hombre me llevará a la cumbre’ de Celeste González.

Houvo mais atividades como concertos, obradoiros, palestras… Mas tampouco me quero estender muito. E para rematar esta pequena viagem cénica polo Festival Agrocuir quero lembrar o manifesto deste ano, que se leu a sexta pola noite. Quero lembrar o momento no que se lembrou às vítimas. Hai algo mais dum ano eu saía correndo do trabalho para poder chegar a tempo à concentraçom que havia em Monterroso, a mesma vila onde celebramos o festival, que era a que ficava mais perto de onde estava. Nom conhecia a Samuel, mas sentim-no como mui próximo. A essa comunidade me refiro. Por isto é preciso o Agrocuir, e é preciso que existam estis artistas.

ê Ariel Q. Sesar

ê Ariel Q. Sesar

Ê Ariel Q. Sesar (esse "ê" é um artigo), pessoa de género incerto. Frequentei as aulas de Dramaturgia na ESADg, embora nunca chegasse a rematar os estudos. Agora frequento aulas de Ciências da Linguagem na UVigo. Escrevo dende a dissidência. Identifico-me e defino-me como dissidente na arte, na língua, no género e na vida.

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